Quarteto
Fantástico
Aos
dois meses de idade foi acometido de uma febre acima de 40°, com muita tosse e
olhos inflamados. Não demorou muito para perceberem pequenos pontos brancos no
interior de sua boca e, não muito depois, apareceu uma mancha vermelha e plana,
iniciando no seu rosto e espalhando para o resto do corpo. Era sarampo! Não
havia sido vacinado e a consequência foi a perda total da visão. Estava
relegado ao descaso e a ser um estorvo para os seus familiares, pois precisaria
de acompanhamento total na realização de atividades básicas, teria dificuldades
para se locomover, não aprenderia a ler e escrever, não teria como brincar com
os coleguinha de sua idade. Batizaram-no de Aderaldo e com o passar do tempo
foi-lhe acrescentada a alcunha de Ceguinho.
Em
outro lado da cidade, a mesma em que Aderaldo crescia excluído de qualquer
participação social, vivia uma bela garota, um pouco distinta das demais de seu
convívio, pois nascera com os olhos puxados, os dedos curtos e grossos, a
cabeça arredondada, os cabelos finos, dentre outra características congênitas.
Sua mãe tinha mais de 40 anos quando engravidou dela e, não fazendo o
pré-natal, o seu nascimento foi uma surpresa para todos, inclusive gerando
desconfiança sobre a sua paternidade, uma vez que não havia semelhança alguma
com seus dois irmãozinhos. Distintamente de Aderaldo, Yori tinha um convívio
familiar tranquilo, em que seu potencial para superar seus limites era
devidamente estimulado. Recebeu um nome de origem japonesa que significa
“dependência”, por causa das suas feições orientais e pela consciência materna
de que dependeria dela para quase tudo.
Austin
não se relacionava “tipicamente” com as outra crianças, não tinha amigos
próximos, não olhava olho no olho, pois tinha deficiências na comunicação,
prejuízos na interação social e comportamento repetitivo e restrito. Foi-lhe
atribuído tal nome porque significa “sublime”, pois suas qualidades
ultrapassariam o comum. Não se sabe realmente a causa de seu transtorno. Há a
hipótese de herdabilidade, mas é quase descartada, já que não há sequer um caso
no histórico familiar. Outra possibilidade seriam fatores ambientais como:
stress, infecções, exposição a substâncias químicas, complicações durante a
gravidez ou desequilíbrios metabólicos. Nada disso parece constar no relato
clínico do casal. Resta somete a proposição genética. Não importa! Será amado e
terá um cuidado todo especial.
Não
se pode dizer o mesmo de Ismael. Os cuidados para com ele não foram muito bons
e, ainda que tenha nascido em uma família abastada, passou a ser considerado
como uma maldição, depois que descobriram que não conseguia reagir aos sons que
o circundavam. O nome de origem hebraica significa “Deus ouve”, mas Ismael não
ouvia, coincidência ou não! O pai, judeu praticante, acreditava ter sido
castigado como foi o sacerdote Zacarias, pai do profeta João Batista, por não
acreditar na gravidez tardia da esposa. Uma lástima! O castigo caiu sobre o
filho, cria desta forma. A mãe teve rubéola quando estava grávida, provável
causa da surdez congênita.
Um
grande vilão assolava as nações com super poderes, até então, insuperáveis.
Suas garras eram afiadas e penetrantes e os braços semelhantes a tentáculos com
ventosas que, além de sugar as consciências, mantinham suas presas alienadas e
totalmente incrédulas em relação à aceitação de alguém que não estivesse dentro
dos padrões impostos por ele. Chamava-se Exclusão e dominava o mundo, até se
revelar o quarteto fantástico: Aderaldo, Yori, Austin e Ismael.
Juntos
formavam a força poderosa contra o inimigo. O primeiro criara meios e
artifícios para se relacionar com sua deficiência, pois usava outros sentidos
como o tato e a audição, valendo-se de aspectos subjetivos para perceber o
mundo. Ela, devido à carga de estímulos e de amor recebidos dos pais, amigos e
familiares, desenvolveu um grande potencial para superar limites, para
acreditar em si mesma e para desenvolver autoconfiança. Componentes
indispensável para romper um dos tentáculos do grande monstro. O outro, como
foi bem estimulado e educado, tornou-se sumamente obediente e, graças a sua
literalidade, passou a cumprir com gosto muitas disposições que, em outros
casos, ocasionariam em rebeldia e desengano. Mais um ponto fraco da abominável
anomalia foi atingido! Por fim, o último super-herói, que havia vencido o antagonismo
da falta de comunicação e adquirido autonomia através da LIBRAS, agora estava
pronto para aniquilar, juntamente com seus companheiros, as forças do temível
oponente. Exclusão derrotada!!
Homenagem
aos componentes do AEE (alunos e professores) da EMEIEF Dep. José Martins
Rodrigues, Maracanaú – CE.
Francisco Fernandes
Jaguaribe, 22 de julho de 2017