Dindim
Gourmet (continuação)
A
aurora surge ainda com maior intensidade e o crepúsculo acontece com muito mais
beleza, na cidade que já não é mais tão singela. Tranquilidade continua sendo
um de seus atributos e a autoestrada federal ainda continua no mesmo local. Rio
e BR já não são mais os limites leste / oeste e aquele, que antes palmilhava
seus 610 km diretamente ao mar, agora desagua no imenso lago artificial com
capacidade para 6.700.000.000mᵌ (seis bilhões e setecentos milhões de metros
cúbicos) de água, o Castanhão. Já faz 24
anos que pus pela primeira vez os pés na cidade do queijo e os dois postos de
combustível não são mais os limites norte / sul da sede municipal. O açude de
Feiticeiro não mais se apresentará como um quebra-cabeça de barro rachado, pois
o grande Orós transpõem suas águas ao imprescindível reservatório. O
Cruzeirinho de Aluísio Diógenes tronou-se um bairro saneado, construído em
regime de mutirão e o Mutirão é agora um grande bairro engendrado pelo êxodo
rural, inevitável nas cidades crescentes, mas capaz de decidir uma eleição
municipal. Aquele que, desembestado em sua caminhoneta Pampa, corria em direção
à sua recém-inaugurada loja na esquina da 8 de Novembro com a Cônego Mourão,
agora é o maior empregador da região e um dos grandes empreendedores do estado.
Fez da Tuboarte uma das referências jaguaribanas.
Acabou
a disputa entre o Clóvis e o Carmela, pois as escolas do estado, Cornélio, Raul
e Sinó, se firmaram com excelência na formação cidadã e do Ensino Médio e os
jovens, que antes não tinham acesso à universidade, agora podem trilhar o tão
sonhado caminho do sucesso profissional, já não mais exclusividade dos mais
abastados. As batatas fritas do Miquinho foram substituídas pelos sushis, os
sanduiches, os açaís e o que é de mais atual para o paladar jaguaribano, mas
nada supera as saudosas coxinhas do Morais, literalmente com um ossinho de
galinha em lugar do palito. Dizem que o peculiar sabor era resultado de um
tacho que nunca era lavado. Que importava? A alta temperatura do óleo consumia
qualquer impureza. Oxalá houvesse um grande tacho desses em Brasília, para
consumir toda a impudência dos coxinhas políticos. É também inadmissível vir a Jaguaribe e não
visitar a famosa barragem de Santana. Banhar-se nas águas que descem
gravitacionalmente das suas inúmeras bicas é um prazer indescritível; e degustar
o saboroso peixe frito do Barto, é uma obrigação.
Jaguaribe
também entrou na era da automação, pois até universidade pública semipresencial
faz parte do rol das instituições de formação. A UAB já tem formado dezenas de
competentes profissionais. Foi ela a responsável pelo meu pioneirismo como
professor de língua espanhola na região. “¡Pues así son las cosas de la vida de la gente!”. Mas
há também desconforto com a tal tecnologia digital e o desenvolvimento, pois
não se usufrui mais do confortável seletivo da Vale do Jaguaribe. As vagas para
a capital são disponibilizadas por um portal online e os espaços tão apertados
das poltronas só são adquiridos quando não são preenchidos no Cariri. Uma das
coisas que pode confortar viagens tão desconfortáveis é uma agradável leitura
deste veículo de comunicação, Arautos do Vale. Já na casa das octogésimas
edições, que circulam mensalmente, pode proporcionar uma agradável e
intelectual leitura do ócio e da informação. Colunistas como, Efigênia Alves,
Osmar Negreiros e muitos outros que enriquecem este periódico, se esmeram na
produção de riquíssimos textos, dignos da produção de uma obra literária a ser
registrada nos anais culturais de Jaguaribe. Por tal iniciativa desbravadora,
parabenizo Sandoli Diógenes, filho e filhas; por arvorarem essa bandeira da
difusão jornalística.
Despeço-me
de Jaguaribe, cônscio do aprendizado e da maturidade aqui adquiridos,
agradecido pelos rebentos gerados neste torrão e guardando em minha memória a
cultura do filé, do queijo, das famílias e das variações linguísticas tão
peculiares, que sempre utilizarei como exemplo em minhas tão singelas aulas. A
antiga “cafona” (nosso dindim gourmet), mesmo não podendo degustá-la por causa
da diabetes, será sempre retomada nas salas de aula da vida. Valeu Jaguaribe!
Francisco Fernandes
Jaguaribe, 10 de setembro de 2017