A Terceira
Margem do Rio
A
Terceira Margem do Rio é o título de um belíssimo conto de João Guimarães Rosa,
que nos foi apresentado em uma formação para professores de Língua Portuguesa. Guimarães
Rosa é um dos autores de ficção experimental da terceira geração do Modernismo.
Sua obra é extremamente original, principalmente pelo uso de neologismo, que é
a arte de inventar palavras, e pela linguagem popular que modificou
radicalmente o regionalismo na literatura.
No
conto, o narrador apresenta-nos um pai de três filhos, sendo dois meninos e uma
menina. O pai é uma pessoa quieta e tranquila, cumpre seus deveres sempre
trabalhando honestamente, mas um dia resolve construir uma canoa e adentrar ao
rio, ficando ali, porém distante das margens. Vive por anos naquela canoa,
longe da família, isolado de tudo e de todos. No início o filho leva comida
para a margens e ele se alimenta dela, sem sair da canoa. Com o tempo os filhos
vão casando, a esposa vai morar na cidade com uma filha e o filho mais velho,
ainda solteiro, resolve ficar na fazenda para cuidar do pai. Depois de muitos
anos o filho decide substituí-lo no seu autoexílio, mas quando vê a imagem do
pai deteriorada pelas intempéries dos longos dias de sol, chuva, desgaste
físico etc., foge e adoece consumido por um grande remorso.
São
muitas as interpretações feitas a esse conto. Uns o decifram pelo viés da
religião, outros da psicologia, do existencialismo. Gostaríamos de analisá-lo
da forma mais simples possível, pois observamos que em alguns contextos nos mantemos
nessa terceira margem, principalmente quando notamos o quanto são melindrosos
os relacionamentos. Alguns chamam isso de covardia, de falta de personalidade,
mas preferimos descrevê-lo como um desejo de amizade, cumplicidade;
principalmente quando se trata de um grupo de colegas de uma mesma instituição.
Há aquela opinião de que futebol, política e religião não se discute, mas
alguns acreditam que se pode debater de tudo, respeitando as ideias e não
conduzindo-as para o lado pessoal.
Em
todos os lugares há sempre, no mínimo, dois grupos. Na política há os de direita e os de esquerda.
Triste é quando, no clímax da discussão, se tenta denegrir o caráter dos
simpatizantes de um deles. Na religião há os conservadores e os liberais. Deprimente
é quando não se encontra o amor pregado por ambos, devido ao calor das controvérsias
teológicas. Na profissão há sempre aqueles que manifestam um enorme desejo de
reconhecimento e o impõe de forma exacerbada ou acham que são melhores que os
outros, não esperando o reconhecimento chegar a bom tempo. Na Educação prega-se
a tão desejada gestão democrática, mas parece que gestores e geridos estão
sempre em pé de guerra. Alguns, não muito dados ao debate, preferem tomar sua
canoa e manter-se no leito de um rio de frugalidade, à terceira margem. Quem sofre
a consequência disso?
As
redes sociais têm sido um verdadeiro ambiente de proliferação de malcriações, xingamentos,
humor negro e tudo que, em uma sociedade madura, se discutiria somente com
solidez de argumentos. Já paramos para pensar no motivo que levou aquele pai
para a terceira margem do rio? Será que não havia “enchido o saco” com as
incompreensões da família, as cobranças que lhe eram imputadas? Margem direita,
margem esquerda ou terceira margem? Céu, inferno ou purgatório? Neste “mundão
de meu Deus”, será que há lugar para se viver com suas próprias ideologias?
Francisco Fernandes
Fortaleza, 11 de junho de 2017
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